Cafeicultura conservacionista faz bem ao planeta
Evento promovido pelo Sindicato Rural de Divinolândia discute o modelo que cuida da saúde do solo e impacta positivamente o meio ambiente
Cultivar cuidando da saúde do solo, do bem-estar humano e, consequentemente, do futuro do planeta é o propósito da agricultura conservacionista. Para sensibilizar os produtores sobre a importância do tema, o Sindicato Rural de Divinolândia promoveu um evento sobre a cafeicultura neste modelo, na última sexta-feira (9/09), com apoio da FAESP/SENAR-SP, SEBRAE e outras entidades. “Com esse Dia de Campo, encerramos a primeira fase do projeto de desenvolvimento rural, com base na sustentabilidade de agroecossistemas e no fortalecimento da cafeicultura familiar. Para isso, uma das estratégias é reconciliar agricultura e natureza, por meio das práticas regenerativas / conservacionistas”, diz Francisco Sergio Lange, presidente do Sindicato.
O evento reuniu cerca de 100 pessoas, entre produtores, representantes de entidades do agronegócio, EMBRAPA (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária), CATI (Coordenadoria de Assistência Técnica e Integral) do SEBRAE-SP, outros sindicatos rurais e empresas.
Os dados mostrados por Alessandro Guieiro, engenheiro agrônomo e palestrante do evento, revelam a urgência do tema. Segundo ele, a Universidade de Harvard (EUA) publicou recentemente um estudo mostrando que, se a agricultura continuar emitindo carbono na proporção de hoje, em 2050, quando a população do planeta estiver perto de 10 bilhões de pessoas, os nutrientes nos alimentos estarão degradados. “Se nada for feito, pelo efeito estufa, os nutrientes terão um declínio de cerca de 10%. Um deles é o zinco, que ganhou protagonismo na pandemia, por estar associado à imunidade. A melhor forma que temos para introduzir zinco na célula humana é através da alimentação. Ou seja, se não mudarmos agora, até o alimento disponível estará deficiente”, analisa Alessandro, especialista em microbiologia do solo e consultor no Brasil e na América Central.
Entre os pontos importantes proporcionados por esse modelo sustentável de agricultura está o sequestro de carbono. Mas, para isso, é preciso ter em mente que o processo conservacionista é a primeira etapa, ou seja, o levantamento do que está sendo realizado de forma errada e que precisa ser trabalhado da forma correta, para que o meio ambiente esteja saudável. “Regenerar significa dar vida novamente, reconstruir as propriedades físicas do solo – biológicas e ecológicas”, explica o consultor. Posteriormente é necessário trabalhar na melhoria contínua, por isso é fundamental a etapa de conservação. A próxima ação não pode interferir negativamente na ação anterior. “Se você fizer algo que destrua o que já fez, é sinal de que não é sustentável, não há coerência”, adverte Alessandro.
Ele nota que o conceito conservacionista está crescendo entre os produtores, o que é positivo. Na produção de café, não basta recolher o grão, fazer a varreção e controlar doenças e pragas. Na visão conservacionista, é preciso estar sempre um passo adiante. “Por exemplo, se prevemos uma seca, vamos cobrir o solo, não faremos o recolhimento de 100% da área, não utilizaremos defensivos que desequilibrem o ambiente. Há todo um protocolo agronômico para não interferir negativamente nas ações”.
Segundo o agrônomo, três pilares devem nortear a prática conservacionista. Primeiro, a máxima entrada contínua de carbono não pode ser interrompida, sob pena de se comprometer todo o processo. Segundo, deve-se buscar o movimento mínimo contínuo do solo. “Quanto menos se utilizarem técnicas como a arruação [que facilita a varredura do café] e gradagem [preparo para o cultivo], melhor. Quanto mais se fazem esses processos, mais está se degradando”. A manutenção contínua da biodiversidade é o terceiro aspecto relevante. “Se o ciclo é interrompido ao longo do ano, para a colheita do café, não está se praticando a produção conservativa”, analisa Alessandro.
Processo contínuo
A agricultura regenerativa tem sido empregada com sucesso nos Estados Unidos, principalmente nas regiões ao norte do país, onde há clima temperado e as estações são bem definidas. Mas Alessandro adverte que o modelo não deve ser simplesmente importado como uma estratégia de marketing que deu certo em solo americano. “No Brasil, não temos mais climas muito definidos”, compara Alessandro, “por isso devemos trabalhar o quesito ‘conservação’ ao longo dos 12 meses por ano”. É preciso que o solo esteja preparado para a inversão climática, quando esta acontecer.
Por enfocarem apenas a regeneração, há produtores que não estão obtendo os resultados esperados. Um dos desafios para implantação e o êxito da prática é essa mudança de paradigma. Por outro lado, Alessandro cita alguns casos de sucesso, entre produtores que já compreenderam a importância de todo o processo e de que ele seja contínuo. No Intercâmbio de Torrefadores 2022 em Batatais, no início de setembro, ele apresentou alguns cases para um público que ficou impressionado em saber que as unidades produtoras estão preocupadas com a emissão de carbono, em reduzir os resíduos químicos e na saúde do solo.
Eventos como o do Sindicato de Divinolândia auxiliam muito na busca por essa nova compreensão. “Sem essa visão e vontade, dificilmente os pequenos produtores conseguirão enfrentar mercados cafeeiros cada vez mais exigentes e competitivos”, declara Francisco. O proprietário João Otávio Cardoso foi um dos participantes do evento, que permitiu novos conhecimentos, segundo ele. “Por exemplo, estávamos usando um mix de sementes para cobertura do solo de forma indiscriminada, mas o palestrante esclareceu que, para cada região, para cada objetivo, tem as sementes específicas”.
À medida que a agricultura regenerativa / conservacionista avança, os ganhos vão ficando mais nítidos. “Há compradores dispostos a pagar mais por esse café; o modelo está fazendo com que a produtividade aumente, porque é necessário melhorar o sistema de produção, e isso vai influenciar positivamente o meio ambiente, de forma global”, comemora o agrônomo. Afinal, empreender ações sustentáveis que gerem impactos positivos no planeta é uma responsabilidade de todos nós.
De acordo com Teodoro Miranda Neto, chefe da Formação Profissional do SENAR-SP, que participou do evento, o solo é o alicerce dos sistemas de produção e precisa ser conservado e manejado corretamente para evitar a sua degradação. “Para se fazer uma manejo ecologicamente correto, é preciso perturbar o mínimo o solo e criar um manejo contínuo da sua biodiversidade, para se obter uma produção equilibrada e de qualidade”. Atualmente, explica Teodoro, o SENAR-SP possui um Programa denominado Nutrição Biológica do Solo, voltado para a Olericultura, na qual capacita produtores e trabalhadores rurais na produção de olerícolas em solos tratados com microorganismos benéficos, visando a obtenção de produtos saudáveis, competitivos no mercado e menor agressão ao meio ambiente.
Deixe seu comentário