Crédito Rural: prudencial e fundamental
Por Tirso Meirelles, presidente da Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp)
Em 2024, o setor agropecuário brasileiro enfrenta um aumento significativo no número de pedidos de renegociação e na inadimplência do crédito rural. Esse fenômeno tem sido impulsionado por diversos fatores, refletindo as dificuldades econômicas e climáticas que atingiram o campo, de norte a sul do país. Entre os principais motivos está a combinação de uma safra prejudicada por eventos climáticos, como secas, altas temperaturas e enchentes, que afetaram diretamente a produtividade agrícola. A queda na produção comprometeu a capacidade dos produtores de gerar receita suficiente para honrar suas dívidas, especialmente em regiões que sofreram perdas severas.
Outro fator agravante para o aumento da inadimplência foi o elevado grau de alavancagem ou endividamento dos produtores rurais. Nos primeiros três meses do Plano Safra 2024/2025 em São Paulo foram desembolsados R$ 11 bilhões, uma queda de 30,4% em relação ao mesmo período da safra anterior. Em nível nacional, o desembolso de crédito rural foi de R$ 112,8 bilhões, queda de 31,1%.
Nos últimos anos, muitos agricultores recorreram ao crédito para financiar seus investimentos e aumentar a produção. Apesar das políticas de juros subsidiados do governo, o aumento da taxa Selic e o encarecimento geral dos insumos agrícolas têm pressionado as margens dos produtores. Isso dificultou o pagamento das parcelas dos financiamentos rurais, especialmente para aqueles agricultores que dependem fortemente de crédito para sustentar suas operações.
Além disso, a acentuada desaceleração na economia global, agravada pelas tensões internacionais e crises comerciais, também impactou o setor agrícola, gerando incertezas quanto à expansão da demanda externa e dinâmica dos preços internacionais. Com o cenário de receita de exportações menos vibrante e menor competitividade, muitos produtores se depararam com preços menores das commodities agrícolas. O mercado de grãos, carne e outros produtos agropecuários enfrentou oscilações negativas de preços que impactaram diretamente o faturamento e margens das propriedades agropecuárias.
A falta de acesso a um seguro agrícola abrangente e eficaz é outro problema que agrava a situação. Embora existam opções de seguro rural, muitos produtores ainda não têm acesso a produtos de seguro eficientes para proteger suas lavouras contra eventos climáticos extremos. Sem um seguro adequado, os agricultores ficam mais vulneráveis e têm maior dificuldade em manter sua capacidade de pagamento em tempos de crise.
Por fim, as políticas de renegociação de dívidas e a burocracia nos programas de refinanciamento também têm dificultado o alívio financeiro. A médio prazo, é essencial que sejam adotadas políticas públicas que garantam maior previsibilidade econômica e proteção contra eventos climáticos, além de uma revisão das condições de acesso ao crédito para o setor agrícola. A Federação da Agricultura e Pecuária do Estado de São Paulo (Faesp) tem reiterado junto às esferas de governo a respeito da necessidade de uma atenção especial aos produtores que já foram penalizados pela crise climática.
Embora existam iniciativas para renegociar ou prorrogar os prazos de pagamento, a demora no processamento desses pedidos, a falta de informações claras e disposição por parte das instituições financeiras fazem com que muitos agricultores não consigam ajustar suas finanças rapidamente, postergando a resolução do problema e o ajuste a este ciclo de baixa. Vale lembrar que os créditos são pagos com o fruto da venda de suas culturas e, quando há quebra, ou quando colheitas são dizimadas, os parcos recursos ficam ainda mais restritos.
O crédito rural é fundamental para a modernização e o crescimento da agropecuária, mas seu uso deve ser prudente, dentro de um certo limite de endividamento, caso contrário, pode se transformar em uma ignição para a corrosão do patrimônio, sobretudo no contexto atual de elevadas taxas de juros.
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